Intérprete e pesquisadora folclórica: Ely Camargo
Intérprete e pesquisadora folclórica, Ely Camargo deveria
ser mais homenageada por nós, brasileiros.
Natural de Goiânia (Goiás), escolheu um gênero de música de
difícil interpretação, mas que precisava mesmo ser
difundido: o folclore, as modinhas, a seresta...Sua voz nos
oferta músicas genuinamente brasileiras e, em diversos
eventos internacionais, como na Suíça, a convite do
Itamarati, esteve representando o Brasil.
Tendo recebido o prêmio de melhor cantora de rádio, de
Goiânia e Brasília, em 1960 e 1961, Ely gravou uma série de
long-plays intitulados "Canções de Minha Terra".
Sua mais recente gravação chama-se "Gralha Azul" e é
inteiramente dedicada ao folclore do Paraná.
Uma de suas mais famosas interpretações - "A Canção do
Araguaia" (composta por Joaquim Edison Camargo - seu pai - e
Francisco Filomon Mascarenhas), nos fala desse rio de grande
beleza, a banhar uma região com taxas demográficas
baixíssimas, o rio da maior ilha fluvial do mundo: a ilha do
Bananal.
Contudo, Ely Camargo não se detém apenas numa região; em seu
repertório encontramos pregões maranhenses (como Preta
Zulmira), canções nordestinas, cocos, danças gaúcha (das
quais um bom exemplo é a Meia Canha).
Ao interpretar uma seresta, Ely está revivendo o antigo
costume, dos namorados, de conquistar pela música a pessoa
eleita por seu coração; esse costume, segundo o testemunho
de Horácio em suas "Odes", já era praticado pelos romanos.
Na Idade Média, em vários países da Europa, os menestréis e
trovadores iam de castelo em castelo, de feudo em feudo,
cantando as virtudes de uma formosa dama, a amada de um
bravo cavaleiro...
Entretanto, Ely não "conversa" conosco sobre temas alheios
ao nosso passado ou à nossa tradição. O Brasil, com seu
folclore, vive no seu coração e ela o transmite a nós, pela
sua voz.
A primeira música do disco "Gralha Azul" recorda a belíssima
lenda, uma das mais características do Paraná, a "Lenda do
Pinheiro e da Gralha Azul", registrada em texto de Eurico
Branco Ribeiro:
"Senhor, eu desejava ser mais útil do que sou.
Nada valho, nada faço, mas se a vossa vontade me reforçar,
serei capaz de muito.
E para provar mais uma vez que tem poderes para tornar
incalculavelmente grande seja um mero animalzinho, o Criador
entregou à gralha uma semente para que a plantasse e a
disseminasse, que faria obra útil.
Foi então que surgiu o pinheiro. E, para premiar a boa
intenção da gralha, cobriu-a o Senhor com um manto azul, que
simboliza a bênção do céu".
Descrevendo o diálogo de um caçador e a gralha, o autor
continua:
"És um assassino! Vem, acompanha-me ao local onde me
interrompeste o trabalho para aprenderes o meu doce mister.
Vês? Ali está a cova que eu fazia, e, além, o pinhão já sem
cabeça, que devia depositar com a extremidade mais fina para
cima. Tira-lhe a cabeça porque ela apodrece ao contacto da
terra e arrasta à podridão o fruto todo; plante-o de bico
para cima para favorecer o broto.
Vai. Não sejas mais assassino".
As melodias de "O Fandango" foram colhidas em colônias de
pescadores de Paranaguá; os Jogos Infantis e as Cirandas nos
trazem uma mensagem da poesia simples que as crianças cantam
tradicionalmente.
Por suas qualidades como pessoa humana, artista profissional
e pesquisadora entusiasmada pelo que faz , não poderíamos
deixar de homenagear essa extraordinária cantora do nosso
folclore: Ely Camargo.
Theresa Catharina de Góes Campos |