Rinha Federal - Cláudio Júlio Tognolli
De: REYNALDO FERREIRA
Enviada: ter 12/4/2005 09:15
Rinha federal
Delegado que prendeu Duda diz que é perseguido por Claudio Julio
Tognolli
Assédio moral. Stalinismo. Terrorismo administrativo. Esses
vocábulos brotam com facilidade da boca do delegado federal Antônio
Carlos Rayol, um dos mais respeitados da Polícia Federal, quando
fala do que vem suportando desde que entrou em rota de colisão com
figuras do alto escalão do governo.
Depois de 28 anos de corporação com uma folha de serviços sem
reparos, o delegado sofreu, em dois meses, cinco diferentes
sindicâncias. Por trás desta devassa está o fato de Rayol ter
comandado a operação que resultou na prisão do publicitário Duda
Mendonça numa rinha de galos, no Rio de Janeiro, em outubro passado.
Desde então, conta, não teve mais paz. Tampouco sua equipe. "Fomos
dissolvidos e perseguidos", diz o delegado.
Em entrevista à revista Consultor Jurídico, o delegado Rayol
desabafa:
O senhor é agora perseguido técnica e politicamente?
A história é um pouco complexa. No dia 28 de outubro do ano passado,
ou seja, sete dias depois da operação, que foi no dia 21, saiu uma
nota no jornal Folha de S. Paulo segundo a qual o presidente Lula
teria determinado ao ministro da Justiça que investigasse se a
operação teve motivação política, e que tomasse as providências que
julgasse adequadas, inclusive com troca de comandos.
Com essa expressão "troca de comandos"?
Sim, esta expressão foi usada pelo jornal Folha de S. Paulo. Em
razão disso nós começamos a observar que realmente começaram a
acontecer coisas estranhas, uma movimentação estranha inclusive dos
advogados do Duda Mendonça. O fato é que de lá para cá eu, o
delegado Lourenço e os dois agentes que assinaram o auto de prisão
em flagrante, fomos retirados da Delegacia do Meio Ambiente e
espalhados pela Superintendência do Rio de Janeiro. Cada um foi para
um setor diferente. A administração tentou mandar os agentes
Guimarães e Amado numa viagem de serviço sem data prevista de
retorno.
Que viagem?
Eles só não foram nessa viagem porque entraram com um mandado de
segurança. Houve uma pressão muito grande da mídia porque a coisa
ficou óbvia demais. Eles se livraram da viagem mas foram afastados
da Delegacia do Meio Ambiente.
E o inquérito?
O inquérito 133, que investigava essas rinhas de galo, foi
paralisado por muito tempo, depois da nossa saída. E uma coisa
interessante é que desde então, até o presente momento, foram
instauradas, na Superintendência do Rio de Janeiro, cinco
sindicâncias, e sabe-se lá mais o que poderão fazer, que são
sindicâncias para apurar as coisas mais estapafúrdias possíveis,
todas relacionadas à operação das rinhas de galo.
E com o senhor?
Vou completar agora 28 anos de serviço público sem nenhuma punição.
De repente me transformo num funcionário respondendo a cinco
sindicâncias. Ou seja: ou eu enlouqueci ou tem alguma coisa de muito
estranho acontecendo. Essas sindicâncias estão sendo instauradas,
estão sendo direcionadas contra a minha pessoa, contra o delegado
Lourenço e contra os agentes Amado e Guimarães, que são os quatro
principais responsáveis pela operação e são os quatro policiais que
foram arrolados pelo Ministério Público como testemunhas de acusação
no processo contra Duda Mendonça e outras cinco pessoas envolvidas
com a rinha de galo.
Os senhores são perseguidos politicamente?
Eu não tenho outra explicação. Tudo o que está acontecendo é muito
estranho. Estamos sendo acompanhados por advogados e eles estão
identificando, em tudo o que está acontecendo, um completo cabimento
daquilo que na doutrina vem sendo chamado de assédio moral. O que
encontramos como exemplos de assédio moral, na doutrina, são
exemplos que se encaixam como uma luva nas coisas que estão
acontecendo conosco hoje. Eu fui retirado da chefia da Delegacia do
Meio Ambiente depois de estar naquela delegacia por três meses, e
disseram que foi um ato de rotina. Isso é um absurdo.
Por quê?
Nenhuma organização do mundo troca a chefia de três em três meses. E
eu pedi ao Serviço de Recursos Humanos da Superintendência da PF do
Rio, certidão com todas as chefias que já ocupei e o período em que
fiquei em cada uma. Eu nunca fiquei em nenhuma chefia por menos de
dois anos. Esse é o período normal. O único caso em que alguém é
retirado de uma chefia por pouco tempo, como foi no meu caso, três
meses, é quando a pessoa cometeu alguma irregularidade muito grande
ou ela está sendo encaminhada para outra chefia. Não foi nada disso
o que aconteceu comigo. Fui retirado da chefia e não recebi sequer
um telefonema me avisando que estava sendo retirado. Fiquei sabendo
pela publicação no boletim de serviços.
O que isso significa?
Foi uma coisa já feita, cuidadosamente planejada para desmoralizar,
para humilhar, e isso tem sido feito não só comigo como também com
os outros funcionários. O agente Guimarães, por exemplo, é um agente
em final de carreira, um agente especial. Segundo o regulamento do
Departamento de Polícia Federal, deve ser empregado em tarefas mais
complexas. Hoje ele foi colocado num balcão entregando documentos,
que é uma tarefa normalmente reservada ao policial que está
ingressando na carreira. Tudo tem sido feito para humilhar, para
desmoralizar, para quebrar o moral dos funcionários, para nos
intimidar com essas sindicâncias. Agora eles estão tentando inventar
irregularidades que nunca existiram na operação da rinha de galos,
para poder justificar todas essas medidas estranhas que eles têm
tomado.
Outros governos fizeram o mesmo?
Olha, isso não é uma coisa nova, não só na Polícia Federal como em
outras polícias. Isso tem acontecido com uma certa regularidade. É
uma prática lamentavelmente instalada, essa questão da interferência
política. Mas, um caso como esse, eu nunca vi. Ele está sendo feito
de uma forma tão escandalosa. As pessoas que estão promovendo esse
terrorismo administrativo, agem de uma forma tão escancarada, como
se tivessem certeza de que nada acontece, de que não existe
Judiciário, de que não existe Ministério Público. Eles estão
revoltando toda a categoria, porque todos os policiais do Brasil
querem ver o fim dessas práticas. Se a população quer uma polícia
que investigue com isenção e independência, essa polícia tem de ter
um mínimo de salvaguarda. Se toda a vez que esbarrar num poderoso ou
num amigo de poderoso acontecer esse tipo de coisa, a polícia não é
mais republicana. Isso que estamos verificando agora é uma
conjuntura completamente stalinista.
Revista Consultor Jurídico, 05 de abril de 2005
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