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OSMAR SANTOS, O MILAGRE...
José Paulo Lanyi

"Osmar Santos, maior do que o mito", copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 22/06/04

"Sempre privilegiei a biografia. A história de qualquer pessoa é a história de todas. Lembra-nos sempre que, como as estrelas, estamos fadados a nascer, a brilhar (cada qual a seu modo) e a morrer, no eterno atrito entre a expansão e a retração. A biografia é sempre um conjunto de experiências. Nunca saio de uma leitura dessas do mesmo jeito que entrei. Podemos ser várias pessoas em uma só vida. Nem sempre melhores, nem sempre piores.

Peguei para ler a biografia do Osmar Santos, escrita pelo seu amigo e ex-sócio Paulo Mattiussi (foto ao lado). Jornalista experiente (ex-Folha, Estadão, JB, Excelsior, TV Globo, Bandeirantes, Record, CNT e por aí vai), Mattiussi conseguiu fugir da apologia fácil e publicou uma obra honesta.

Nela, Osmar é um mito, sim. Mais para os deuses impulsivos do Olimpo que para os santos imaculados e distantes. Em 22 de dezembro de 1994, um motorista bêbado poderia ter destruído ‘a vida de um ídolo, a vida de toda uma família’, como está no livro. Só o conseguiu parcialmente. Pois, muito acima do ídolo, do mito ou da lenda pairava um ser absolutamente titânico em sua dimensão humana.

Osmar Santos, outrora prodígio da fala altissonante, hoje um silencioso pintor impressionista, legou-me a inspiração de seu exemplo - que é o de muitos anônimos heróicos, maiores do que a fama e suas ilusões.

A obra que eu li é elogiável, pois, a partir de um exemplo público, imprime na alma toda aquela dimensão catártica das tragédias gregas. Mostra que o indivíduo, célebre ou obscuro, tem tudo para ser o herói de si mesmo. Desde que se permita vergar-se, diante da ventania, e evitar que se quebre.

Emparedado pelo destino, Osmar Santos arrancou-se de seu sofrimento e legou-nos a reflexão sobre as nossas próprias e várias fraquezas. Muitos deixaram de procurá-lo. ‘O ser humano se relaciona trocando informações. Como se cada informação fosse uma moeda. O Osmar não tem mais essa moeda para trocar’. Ainda hoje, no entanto, o Pai da Matéria é aplaudido e respeitado por onde quer que ande, quase dez anos afastado das transmissões.

O livro de Mattiussi mostra por que Osmar chegou tão longe em suas conquistas. Por trás do talento, havia garra, força e sabedoria. É a história de um homem famoso, como poderia ser a de milhares de pessoas pobres e incógnitas deste País.

Em Ribeirão Preto (SP), o lançamento de ‘Osmar Santos-O Milagre da Vida’ (Editora Sapienza) será nesta quarta-feira (23), às 11h, em uma feira de livros da cidade (o autor não deu mais detalhes). Em São Paulo, será no dia 29/06, às 19h30, no restaurante Nolita (Rua Jerônimo da Veiga, 248- Jardim Europa). O preço nas livrarias varia entre R$31 e R$38.

Trechos:

E, quando o carro passou pela frente do estádio, Osmar deu o primeiro sinal de que, mesmo de volta à vida, tinha consciência do quanto a sua vida tinha mudado. Oscar Ulisses descreve a cena: ‘Ele virou o rosto para o lado como se quisesse encarar o Pacaembu de frente. A mão esquerda se levantou com dificuldade e apontou para a porta do estádio. Ele tentou falar alguma coisa, mas não conseguiu dizer nada. Ficou triste de repente e abaixou a cabeça, e, em silêncio, começou a chorar’.

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‘Ele não pára. Tem sempre alguma coisa para fazer, alguém para visitar, um filme para assistir. Conhece todas as galerias de arte de São Paulo. Vai para o Guarujá como quem vai à padaria da esquina de casa. Ele consegue se trocar com rapidez e incrível mobilidade dentro do carro. Não se aperta nunca’, conta esse mulato de fala mansa, que começou a trabalhar com Osmar por falta de outra opção de emprego e ganhou calos nas duas mãos de tanto dirigir.

O motorista de Osmar é João Carlos Pereira dos Santos, ‘casado, três filhos, paciente como Jó’.

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Henrique Guilherme, que trabalhou durante quase onze anos na equipe de esportes da Globo, recorre à ironia para definir não o companheiro de transmissões, mas o Osmar ocupando o cargo de chefia. ‘Quando me perguntam se ele era um bom chefe, eu respondo: se era um bom chefe, não sei... Mas foi o irmão que todo mundo queria ter’. O que Henrique quer dizer é que, na opinião dele, Osmar se preocupou muito mais em garantir a carreira dos irmãos Oscar e Odinei do que com o futuro dos outros profissionais que faziam parte da sua equipe. Há quem discorde (...). Como o locutor Paulo Soares. Ele trabalhou com Osmar na rádio e TV Record (de 1988 a 1991) e na Globo (de 1991 até 1998). ‘Ele lutava, sim, por melhores salários, transporte seguro e hospedagem decente para todos. Fui testemunha desse comportamento em várias oportunidades’.

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Naquele domingo de 1974, não foi diferente. Osmar perguntou e Milton [Neves] não tinha uma notícia internacional para dar. (...) Milton não se apertou e liberou a criatividade: ‘O destaque, Osmar, é a decisão do título sul-americano de boxe, peso leve, entre o chileno Juan Contreras e o argentino Ortiz Pena’. Osmar fez o que sempre fazia: ‘Quem é o favorito, [Claudio] Carsughi?’. E Carsughi não decepcionou. ‘O Contreras, meu caro Osmar, tem uma esquerda mortal. Mas o Ortiz é mais experiente, tem mais nocautes em seu cartel, por isso é o favorito’. Carsughi nunca admitiu a sua farsa.

Do capítulo ‘Inimigo dos Comentaristas’.

Link SP- O Osmar é uma homem maior do que o seu mito, como se o ‘Edson’ fosse maior do que o Pelé?

Paulo Mattiussi- Concordo, o mito está na lembrança das pessoas e o homem sobrevive com uma outra forma de expressão de arte que é a pintura, superando os limites físicos que vão desde o problema da fala até o lado direito do corpo praticamente paralisado.

LSP- Você se consumiu emocionalmente para escrever?

PM- Totalmente, eu conheço o Osmar desde 74, até hoje a gente foi amigo, eu fui funcionário dele e fomos sócios em várias coisas. Temos uma vida muito ligada. Uma das grandes preocupações que eu tinha, por isso o livro levou mais de dois anos para ser concluído, era radiografar o Osmar mostrando o mito e as falhas como gente, ser humano.

Foi por isso que demorou. Fiz mais de oitenta entrevistas para tentar montar um perfil com as pessoas que participaram da vida dele.

LSP- As fraquezas foram vindo com os depoimentos ou você foi buscá-las?

PM- Fui buscar porque conheci o Osmar perfeitamente. Saí para confirmar algumas histórias que eu já sabia, para não ficar na postura de que sou eu que escrevo.

LSP- Antes do acidente, o Osmar era um homem contraditório? Omisso como chefe e generoso como colega?

PM- Não que fosse omisso como chefe. Existe uma diferença, todo mundo o compara como chefe ao Pedro Luiz. O Pedro Luiz tinha uma vantagem, viveu uma época em que as empresas não eram tão profissionais como hoje. Pedro Luiz tomava conta de tudo, do artístico, das transmissões, da técnica, ele administrava o dinheiro. Com o Osmar, não, as empresas é que administravam. Ele passou pela Joven Pan, uma empresa familiar em que o Tuta comandava com mão de ferro. A Globo se modernizava, foi a primeira a ter recursos humanos. Na Record, quando a gente foi sócio, as pessoas que trabalhavam conosco tiveram aumento todo mês de acordo com a inflação.O Osmar foi pego na modernização das empresas. Como profissional não tem o que falar. O próprio Washington Olivetto diz no livro que a história do rádio existe antes e depois do Osmar.

LSP- O Osmar foi informado de cada detalhe do livro? Já consegue se lembrar desses fatos? Como é que ele lida com isso?

PM- O primeiro cara a escrever um livro foi o Audálio Dantas. O Osmar não se entusiasmou muito com o projeto, o Audálio também não. Dois anos depois eu propus e ele concordou, participou ativamente, contava algumas histórias, tem uma memória privilegiada. O Osmar teve influência no livro, pediu para eu tirar algumas coisas. Ele tem consciência do que está no livro e tem consciência da vida dele."
 

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